Por Marcelo Andriotti, G1 Campinas e região


Marília Pimentel Cotinguiba coordenou desenvolvimento de dicionário — Foto: Antoninho Perri/Unicamp

Campinas (SP) tem cerca de 1,6 mil refugiados que necessitam de auxílio e da ação de políticas públicas para conseguirem emprego, atendimento de saúde e assistência social. Desses imigrantes que buscaram a cidade para reconstruírem suas vidas, cerca de mil vieram do Haiti.

Para facilitar a adaptação deles várias ações estão sendo feitas, entre elas um dicionário crioulo haitiano/português e português/crioulo haitiano, organizado por uma pós-doutorada da Unicamp, que deverá ser lançado em versão impressa e e-book na primeira semana de dezembro.

Outra iniciativa para atender migrantes refugiados na região de Campinas vem também da Unicamp, que deve implantar a partir de outubro a Cátedra Sérgio Vieira de Mello Para Refugiados. Ela reunirá diversas faculdades e institutos para oferecer programas específicos para os migrantes dentro e fora da universidade.

Marília Pimentel Cotinguiba, professora da Universidade Federal de Rondônia e pós-doutorada pelo Nepo (Núcleo de Estudos de População) da Unicamp, trabalha com pesquisas sobre o movimento migratório dos haitianos. Desde o início dos trabalhos ela sentiu dificuldade em conseguir traduções confiáveis quando se comunicava com eles.

O livro começou a ser elaborado em 2013 em Rondônia e já tem mais de dois mil verbetes. Além de Marília, desenvolveram o dicionário os professores Geraldo Castro Cotinguiba, o professor Pedro Ivo Andretta e os estudantes de Letras da Universidade Federal de Rondônia.

“A ideia desse dicionário surgiu durante as aulas de ensino de Língua Portuguesa para imigrantes haitianos. Durante essas aulas, usamos um método de sempre anotar no quadro as palavras em português e em crioulo haitiano (escritas pelos próprios haitianos). Um aluno monitor do curso de Letras anotava as palavras e fomos fazendo um banco de vocábulos. Não temos informações de outros dicionários do gênero”, disse.

O crioulo é uma língua que mistura o francês e algumas línguas do Oeste da África, como o iorubá. Outras versões do crioulo são falados fora do Haiti, como em Cabo Verde e nos Estados Unidos, na região da Luisiana, e outras regiões do Caribe.

O campus da Unicamp no distrito de Barão Geraldo — Foto: Unicamp

Ferramenta

No Brasil, atualmente, há cerca de 90 mil haitianos segundo Marília, principalmente no Sul e Sudeste. Houve uma retração dessa população em 2016, por conta da crise econômica, mas ela voltou a crescer em menor ritmo neste ano.

O dicionário é uma ferramenta que vai ajudar tanto para a adaptação desses haitianos no Brasil ou em outros países de língua portuguesa, quanto para quem trabalha com esses imigrantes. Ele deve ser lançado pela editora Universitas.

“Esse é um produto que vai ser essencial para haitianos e pra nós também, que trabalhamos com eles. Esse movimento de refugiados no Brasil é muito recente e ainda estamos nos organizando para atender melhor as suas necessidades”, diz Fábio Custódio, diretor de Cidadania da Secretaria Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Cidadania de Campinas.

Marília diz que vai para o Haiti onde fica nos próximos dois meses e deve conseguir mais subsídios para o livro, que terá constante atualização na versão on line e futuras reedições impressas revisadas e ampliadas.

Cátedra

A doutora Rosana Baeninger, presidente do grupo de trabalho da Cátedra Sérgio Vieira de Mello, diz que em outubro a Unicamp deve receber a chancela do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), criador da cátedra, para o início dos trabalhos.

No dia 5 de setembro foi realizado um fórum na Unicamp para discutir as ações que serão implementadas com a participação de representantes da universidade, da Prefeitura de Campinas e da Agemcamp (Agência Metropolitana de Campinas).

“A Unicamp será a primeira universidade estadual a implementar a cátedra e nosso modelo deve servir de parâmetro para outras instituições. Ela funcionará junto à reitoria e deve envolver todas as unidades de forma transversal, desenvolvendo trabalhos dentro e fora da universidade”, diz.

Além do dicionário de crioulo haitiano que será utilizado nos trabalhos, a cátedra também prevê o desenvolvimento de ferramentas para o ensino de línguas, especialmente português para estrangeiros, atendimento de profissionais da área de saúde e outras políticas sociais, além de pesquisas acadêmicas sobre os imigrantes.

Deseja receber as notícias mais importantes em tempo real? Ative as notificações do G1!
Mais do G1